terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Amargura para Geísa

Noutra vez - num domingo pela manhã - estava eu limpando os líquidos corporais acumulados na cama durante a noite, retirando com uma pá as fezes que ela deixara espalhada, enquanto ela repousava na banheira de águas perfumadas - canela, rosas, menta -, esperando que eu terminasse a fétida tarefa e fosse ter com ela, para esfregar-lhe as costas, os imundos quadris e as banhas mal-cheirosas. Geísa fede, mas eu faço o possível para mantê-la limpa e bem cuidada. Esfrego-lhe por inteiro com um sabão aromático à base de ervas, e deixo-a metida na infusão de folhas e raízes, para acalmar-lhe a mente perturbada. Detive-me com as sacolas de resíduos na escada, a meio caminho das latas de lixo, ao ouvir a campainha. Repetidamente ela balançava a sineta, esperando que eu aparecesse. Não fiz menção de retornar, e continuei meu caminho. As sacolas pesavam - líquidos e restos podres de Geísa. Joguei-as no devido lugar e voltei pela cozinha, para tomar um copo de água. A campainha não tocava mais. Lavei minhas mãos lentamente, subi as escadas e encontrei Geísa submersa, a face rubra, os olhos saltados, o corpo exaurido de Geísa. Contemplei durante uns segundos aquela massa obesa, disforme sob a água, admirando os pulmões de Geísa se afogarem, e seu coração lutar para bombear sangue para um corpo inerte. Não; Puxei-a pelo pescoço e a ouvi tossir, engasgar-se e regurgitar água perfumada por todos os poros. Olhei para ela, as faces retomavam a cor normal, e ela devolvia um olhar anuviado. Não.

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